HISTÓRICO E PREVISÕES

Igor Lucena e Milla Maia destacam as incertezas globais geradas pela invasão da Ucrânia por forças militares russas

Por Marcelo - Em 28/02/2022 às 6:15 PM

O conflito entre Ucrânia e Rússia não é de hoje e remonta do Século XVII, segundo explicam os especialistas Igor Lucena e Milla Maia, quando uma grande parte do atual território ucraniano foi integrado ao Império Russo. E somente após a 1ª Guerra Mundial a Ucrânia foi formada como Estado pela primeira vez. Depois passou a integrar a antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e foi declarada independente em agosto de 1991. Igor é economista, diretor de investimentos do Grupo Corpvs, doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Lisboa e membro do The Royal Institute of International Affairs. Milla também é economista, especialista em finanças, relações com investidores e M&A.

Igor Lucena diz que guerra terá efeitos em nível global                                          Foto: Portal IN

Outras questões de repressão russa e uso de alguns países menores do Leste da Europa para defender suas fronteiras, que ficou conhecida como “cortina de ferro”, que formavam o chamado Pacto de Varsóvia. A Ucrânia recebeu muitas pressões por décadas para perda de sua identidade nacional, especialmente na época do governo de Joseph Stalin, gerando um trauma e uma grande rejeição à Rússia. Após a queda da URSS e a independência ucraniana, os governantes de Kiev se aproximaram da União Europeia e da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), demonstrando claro interesse em ingressar nestas duas organizações. E essa intenção não foi bem vista pelo Kremlin.

Em, artigo publicado no site Millennium, os economistas e analistas de relações internacionais destacaram que o estopim que levou ao conflito que se desenrola atualmente no Leste da Europa, teria iniciado ainda em 2014, após a invasão da Crimeia pela Rússia, anexando aquela região autônoma no Sul da Ucrânia ao seu território, gerando uma tensão militar que se manteve crescente nos anos seguintes.

Do ponto de vista geopolítico, militar e de segurança global, a OTAN também teve um papel importante nesta situação de tensão, uma vez que a Rússia sempre temeu que a aliança militar ocidental viesse a ocupar espaços perto de suas fronteiras. E isso se ampliou com a adesão à OTAN de ex-integrantes da URSS, como Estônia, Letônia e Lituânia. Com isso, tais países passaram a integrar a União Europeia e se aliaram ao bloco liderado pelos Estados Unidos e o Reino Unido. Além disso, o artigo 5º da OTAN destaque que: “Ataque a um membro é um ataque a todos os membros”. E foi exatamente este ponto que fez com que Vladimir Putin visse essa expansão como um risco à soberania russa e falou não admitir o ingresso da Ucrânia na OTAN, que representaria um aumento de bases militares ocidentais próximo às suas fronteiras.

Conflito atual e os impactos globais

Guerra na Ucrânia deixa um ar de incertezas sobre duração do conflito e efeitos na economia mundial

Veja o que afirmam os dois especialistas sobre a guerra que, atualmente, tem gerado uma ampla condenação por parte de praticamente todos os países do mundo e tem feito vítimas civis, militares e provocado uma retirada em massa de ucranianos para países vizinhos.

“Desde o final de 2021, a Rússia intensificou suas tropas militares na fronteira com a Ucrânia, o que resultou em uma invasão terrestre, marítima e aérea dessa região, no dia 24 de fevereiro de 2022. Acontecimento, que validou os temores do Ocidente. Foi o maior ataque de um Estado contra outro na Europa, desde a II Guerra Mundial. A tensão entre Rússia e Ucrânia envolve diversos atores políticos em nível mundial e regional. Os Estados Unidos têm um papel determinante nesse contexto, por serem a maior potência econômica e militar do mundo, além de serem vistos como opositores da política externa russa. Dessa forma, a Ucrânia tem buscado apoio dos Estados Unidos e seus aliados, com o intuito de fortalecer suas posições militares e políticas em um possível conflito contra os russos. Esse apoio é percebido, por exemplo, por meio da disponibilização estadunidense de armas e treinamentos para o exército ucraniano. Além disso, os Estados Unidos veem no apoio à Ucrânia uma tentativa de enfraquecer as aspirações territoriais russas e, consequentemente, sua influência geopolítica regional”, destacam.

“A Rússia e os Estados Unidos são países com visões opostas, o que tem gerado diversos focos de tensão ao longo do tempo, com destaque para o período da Guerra Fria. O ataque da Rússia à Ucrânia é, mais uma vez, uma forma de combate aos Estados Unidos, que aconteceu semanas depois que o presidente russo Vladimir Putin se reuniu com Xi Jinping, secretário-Geral do Partido Comunista da China e Presidente da República Popular da China desde 2013. Ambos os lados anunciaram uma parceria estratégica destinada a combater a influência dos Estados Unidos. Juntos, Rússia e China possuem o maior arsenal nuclear da atualidade – principalmente pela força bélica e capacidade de cyber ataque por parte da Rússia e a força econômica, tecnológica e tamanho do exército), por parte da China”, salientam.

“Um conflito, como o da Rússia e da Ucrânia, tem potencial para envolver diversos países, de forma que pode dividir o mundo em dois grandes eixos e gerar grandes prejuízos para a economia global. A Rússia possui um dos exércitos mais forte do mundo e um número considerável de armas nucleares. Já a Ucrânia, modernizou sua capacidade bélica com armas e equipamentos oriundos de países ocidentais. Assim, o conflito pode evoluir para uma guerra em nível regional e até mesmo mundial – pelo apoio das nações ocidentais, como Estados Unidos e Reino Unido à Ucrânia, assim como países aliados à Rússia, como Belarus e China. Além do perigo eminente bélico, a Rússia é hoje o segundo maior produtor mundial de gás natural e uma das maiores nações produtoras de petróleo do mundo. Com as notícias sobre o conflito, os preços do gás europeu aumentaram e as expectativas sobre o preço do petróleo Brent, de referência internacional, ultrapassaram US$ 100,00 o barril. Fato que não ocorria desde 2014. O fornecimento de gás proveniente da Rússia, que passa pela Ucrânia, poderá ainda ser interrompido, afetando o abastecimento de vários países da Europa Central e Oriental. Cenário esse que pode ocorrer durante o inverno e em meio à pandemia de coronavírus”, informam.

Milla Maia defende as sanções como congelamento financeiro

“Uma das alternativas para conter o avanço russo foi a criação de novas sanções dos países ocidentais à Rússia. O presidente americano, Joe Biden, disse que haverá restrições envolvendo transações do governo russo em moedas estrangeiras e o bloqueio dos ativos dos quatro grandes bancos russos. Biden, com isso, ainda declarou que as relações entre Washington e o Kremlin se encontram em ruptura completa. O primeiro-ministro do Reino Unido, Boris Johnson, também anunciou sanções econômicas, como congelamento financeiro e o banimento de exportações”, explicam Milla e Igor.

Em sua conclusão, os dois especialistas destacam que depois dos últimos acontecimentos, a Ucrânia está vivendo um jogo de perde-perde. Pois se continuar a se defender, deve perder sua autonomia e haverá a queda do governo central de Kiev para a Rússia. E se assinar acordo se comprometendo a não se associar à OTAN, mostrará que sua política externa está subjugada aos desejos de outra nação, no caso a Rússia.

“Fica evidente que uma “caixa de pandora” foi aberta. Um marco do início de uma nova era de conflitos significativos entre as potências ocidentais e as potências totalitárias orientais. Reflexo de um histórico de líderes fracos, pouco preocupados com segurança, democracia e liberdade, que pode culminar em enormes impactos geopolíticos, econômicos, sociais e financeiros para a população global. Os erros do passado, assim, parecem não terem servido como lição para os envolvidos, ao passo que a história se repete. O conflito se mostra longe de acabar, as sanções aplicadas até agora não surtiram o efeito desejado contra o Kremlin, que se mostra preparado estrategicamente e alinhado com a China comunista de Xi Jinping”, dizem.

“Sem uma ofensiva forte por parte da OTAN e principalmente dos EUA, ademais das medidas econômicas e diplomáticas, a Rússia continuará tendo força para continuar sua ofensiva. Seja qual for o desfecho do ponto de vista geopolítico, é importante afirmar que se abre hoje uma nova porta do ponto de vista de relações entre nações, onde o Hard Power passa a ter uma relevância cada vez mais forte nos próximos anos. A segurança nacional passa ter uma predominância no campo das relações internacionais, tão importante quanto a economia e as finanças. Creio que projetos como um Exército Conjunto Europeu devam avançar com mais rapidez na Europa e nações como a Alemanha e Japão (que possui conflitos territoriais com a Rússia), devem voltar a se armar para proteção de seus territórios e suas populações. De fato, abrimos uma nova corrida armamentista no planeta”, complementam Milla Maia e Igor Lucena.

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